Empenho e diversão

De bonecos a livros, jogos ou figurinhas, o prazer de colecionar mobiliza diferentes interesses e conquistas

Há uma intensidade passional na ideia e no ato de colecionar. Objetos, obras de arte, livros, revistas em quadrinhos, selos, toy art, figurinhas dos jogadores da Copa, não importa o que seja. Mais do que desejo de possuir materialmente alguma coisa, fica, como nas melhores paixões, a excitação da experiência, do esforço, do impalpável, da procura e do encontro que não se explicam racionalmente. Por isso, o prazer de colecionar mobiliza tantos grupos e interesses diferentes.
“Com as figurinhas da Copa, acaba sendo uma oportunidade de socializar também, de encontrar as pessoas, trocar ideias, descobrir afinidades ou quais são os craques mais difíceis de conseguir e por aí afora”, diz o administrador José Humberto Mendes, 43 anos, enquanto conversa com amigos em um ponto de troca de figurinhas na região da avenida Paulista. “É um hábito da adolescência que é divertido de viver agora junto com o meu filho, que tem 9 anos e é fanático por futebol. Por isso acaba virando um programa de família”, ele afirma, orgulhoso por estar prestes a completar (faltavam 38 figurinhas para “fechar”) o álbum da Copa da Rússia, que passaria ao acervo em que constam, “quase completos”, os álbuns das Copas do Brasil, de 2014, e da África do Sul, de 2010. E os das Copas da época da adolescência? “Acabaram se perdendo porque mudamos de casa muitas vezes, mas ficam as lembranças, o que para um colecionador já é ótimo”, afirma Humberto.
Não sugira à estudante de psicologia Jamile Marques Trebejo, 22 anos, que ela desapegue da coleção de livros, entre outros itens temáticos, da série Harry Porter, o fenômeno editorial da inglesa J.K.Rowling. “Comecei a ler quando tinha uns 12 anos e esses livros têm memória afetiva para mim. Algumas amigas implicam, porque dizem que parece que eu fiquei na pré-adolescência, que esse gosto me infantiliza, mas eu nem ligo. É tão fantasioso e foi uma leitura tão importante para mim que tenho o maior carinho pelo personagem e pela coleção dos livros”, ela diz. Hoje disponível num box em edição de colecionador (veja ao lado), a série de livros do adorável aprendiz de bruxo continua seduzindo muitas gerações.
No romance Todos os nomes, o escritor José Saramago sugere que o motivo que leva as pessoas a colecionar objetos, não importa quais sejam, teria a ver com o que “poderíamos chamar angústia metafísica, talvez por não conseguirem suportar a ideia do caos como regedor único do universo, por isso, com as suas fracas forças e sem ajuda divina, vão tentando pôr alguma ordem no mundo.”
Tão poético quanto radical, o ponto de vista do escritor não exclui a certeza de que o verbo colecionar continua fascinando muitas tribos, em especial o público que ama cultura pop, como bem observou, em texto especial para a Vila Cultural, em 2017, Rafael Menezes, do departamento de compras da Livraria da Vila, ao destacar a recente “mania” de colecionar bonecos que fazem o maior sucesso. “(…) Talvez o grande exemplo hoje de publisher com um catálogo bem diversificado seja a Funko, que se tornou uma febre no Brasil e no mundo. A Funko consegue ter o mesmo apelo para os personagens do universo pop-nerd como todos os Vingadores, o Universo Dc, Star Wars e ampliar ainda relacionando com games (Street Fighter, Assassin’s Creed), seriados (Breaking Bad) Disney (Relâmpago McQueen, Dumbo, Frozen) e cantores internacionais como Amy Winehouse e Axel Rose. O grande diferencial da Funko, porém, é seu design, indo na contracorrente do que um colecionável era conhecido, a verossimilhança. Criou-se um design simples, nem tanto infantil, mas com uma aparência lúdica que atinge tanto crianças quanto adultos e a um preço mais acessível (em torno de R$ 100). Foi um aparato essencial para que a explosão do Funko’s começasse em 2014 e se mantivesse até hoje”.
Além de expert no tema, Menezes sintetiza com propriedade os “mistérios” das coleções. “Na prática, coleciona-se porque há um prazer, independentemente do motivo, e um imenso orgulho de poder mostrar na estante que aquela é sua coleção particular. Seja livro, boneco ou um item exclusivo, o ser humano coleciona também para se expressar e dar forma a uma das características mais notáveis da sua própria existência”, conclui.

 

Harry Porter
O box inclui os sete livros da saga criada por J. K. Rowling para contar as aventuras do aprendiz de bruxo contra o maléfico Voldemort. Nessa edição de colecionador, há novas capas e ilustrações.

 

 

Banco Imobiliário
Eis um item para colecionadores de jogos de tabuleiro. Com ares vintage, já que foi objeto do desejo nos anos de 1980, o jogo mantém seu jeitão retrô, agora com um mercado de imóveis que se modernizou e segue ainda mais competitivo para jogadores que querem ficar milionários. Pelo menos na diversão.

 

Canecas
Itens utilitários que revelam personalidade enquanto se bebe, as canecas – de séries como Game of Thrones e incontáveis motivos e personagens – são, além de peças de coleções, ótimos presentes para dar ou receber.

 

Bonecos Funko
Com uma forma peculiar pela desproporção entre corpo e cabeça, de design divertido e encantador, eles se multiplicam em temas, personagens e possibilidades como um adorno de época capaz de dar vida e graça a qualquer estante.

 

Jogo da Vida
Outro clássico da década de 1980, faz a simulação da vida real ao tratar, no plano da ficção mais lúdica, de situações que envolvem carreira, finanças, casamento, família. Tudo com acessórios bem divertidos.

 

 

Chaveiros
O ídolo brasileiro do automobilismo, que é adorado em outros lugares do mundo, como o Japão, por exemplo, é homenageado em chaveiros temáticos que, além de ser uma graça, combinam com coleções de boas referências para se ter na vida.