Encontro memorável

“Sentia que era uma obra quase que sagrada”, diz Mauricio de Sousa sobre o trabalho de Monteiro Lobato

*Entrevista publicada na revista Vila Cultural 178 (Fevereiro/2019)

Desde maio de 2011, Mauricio de Sousa ocupa a cadeira número 24 da Academia Paulista de Letras. É um honra e um mérito cheio de simbolismos para o criador da Turma da Mônica, com os personagens que surgiram a partir de 1959. Depois da revista Mônica, lançada em 1970, ele não parou mais de produzir histórias e publicações de sucesso. Em 1971, ganhou o prêmio Yellow Kid, em Luca, na Itália, que é o Oscar dos quadrinhos. O estúdio que comanda atualmente dá vida a mais de 300 personagens. Mauricio falou à Vila Cultural sobre o lançamento de Narizinho Arrebitado.

 

Vila Cultural. Como surgiu a possibilidade de fazer o livro e qual a importância de voltar à obra de Monteiro Lobato neste momento?
Mauricio de Sousa. A editora Girassol propôs e aceitei. Ao contrário do que aconteceu há alguns anos, quando recebi proposta semelhante mas não me senti à vontade. Tinha lido tudo de Lobato. Havia trechos de seus livros que eu decorara. Sentia que era uma obra quase que sagrada. Imexível. Mas agora foi diferente. Talvez porque lancei muitos livros ou porque Lobato estava mais distante, resolvi encarar. Senti que poderia colaborar para a volta da atenção à obra de Monteiro Lobato. Iniciaríamos com um trabalho em cima do seu primeiro livro infantil publicado, Narizinho Arrebitado, em que ele apresentou o Sítio do Picapau Amarelo. Muitos não lembram e por isso é preciso que se reapresente este livro aos novos leitores com a modernidade da adaptação com os personagens da Turma da Mônica.

VC. O que mais o surpreendeu – ou encantou – ao recriar personagens  tão potentes no imaginário de algumas gerações de brasileiros?
MS. Primeiro senti imenso prazer em reler o Sítio depois de tantos anos. Sentir o prazer de percorrer o estilo criativo e surpreendente do meu velho ídolo na excelente adaptação da escritora Regina Zilberman foi uma delícia. Afinal, ela é uma das maiores especialistas brasileiras em Monteiro Lobato. E já havia trabalhado em outro livro da Turma da Mônica. O que era ótimo. Conhecia bem os dois lados. O que me surpreendeu foi minha própria aceitação em participar desse “cross-over” juntando as turmas da Emília e da Mônica. Mas fui de cabeça e coração. Lobato e as novas gerações de leitores merecem.

VC. Além da habilidade em se comunicar com as crianças, o que há em comum entre a sua obra e a obra de Monteiro Lobato?
MS. Lobato, na minha infância, foi um dos inspiradores para eu me decidir pela futura atividade de escritor e desenhista para crianças. Encantei-me com seu estilo, sua originalidade misturando fantasia e realidade. Quis seguir seus passos. E assim foi. Tive minhas oportunidades, criei meus personagens e, como a turma da Emília, a turma da Mônica também estimulou milhares crianças para o hábito da leitura, para as portas da literatura.

VC. Qual a sua opinião sobre as críticas de racismo feitas a Monteiro Lobato?
MS. Faço minhas as ponderações expressas na orelha do livro Narizinho Arrebitado pelo advogado e reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, o sociólogo José Vicente.