O italiano Carlo Collodi deu vida longa e eterna ao boneco que se transforma num adorável menino
Se um único personagem ou apenas uma estória extraordinária fosse suficiente para garantir a um autor um lugar para a posteridade, esse seria o caso do italiano Carlo Collodi, pseudônimo do jornalista e escritor Carlo Lorenzini, o criador de Pinóquio, que nasceu nos anos de 1880 e desde então atravessa gerações encantando crianças e adultos. No próximo dia 26 de outubro, completam-se 128 anos da morte de Collodi e a efeméride é um ótimo pretexto para entender o longo alcance e a atemporalidade de sua criatura mais ilustre.
Para confirmar o interesse muito atual por uma aventura encantadora – e secular –, a distribuidora Cinecolor, licenciada da Walt Disney, acaba de relançar no mercado brasileiro o blu-ray com a versão de Pinóquio para o cinema, que estava fora de mercado desde 2015. Potencialmente cativante para novas gerações, o filme passou por restauração digital de som e imagem, o que deixa o clássico infantil literalmente ainda mais brilhante.Originalmente feito para celebrar o 70º aniversário de Pinóquio no cinema, o blue-ray resgata todos os detalhes da animação, além de trazer a premiada e inesquecível canção When you wish upon a star e a história emocionante do “menino de madeira” que ganha vida com suas descobertas.
Mas antes da criatura, no entanto, o criador fez história. Carlo Collodi nasceu em Florença em 1826 e consta que trocou o sobrenome oficial pelo pseudônimo para homenagear a aldeia onde sua mãe nasceu. Autor de estórias infantis numa época em que os contos de fada, a oralidade e o encantamento da fala tinham várias “funções/intenções” morais ou simbólicas, Collodi assinava artigos e comédias na imprensa italiana, em especial para o periódico Il Fanfulla, em que fez fama com textos intensos e divertidos. Um vilão chamado Gianettino era o protagonista de uma série infantil que o escritor começou a publicar a partir de 1876. Pinóquio surgiu em uma aventura chamada Storia di un burattino, em 1881, revelando todo o seu carisma nas ilustrações do artista Eugenio Mazzanti. Coletâneas com artigos e peças de de peças humor originalmente publicadas na imprensa italiana, Collodi também lançou livros como Macchiette, de 1880, e Storie allegre, em 1887.
O fascínio por Pinóquio não se deu ao acaso, sobretudo num período em que as tramas infantis já indicavam a vocação para orientar as crianças na compreensão do mundo em toda a sua complexidade de valores e descobertas. Nesse sentido, As aventuras de Pinóquio é uma referência preciosa, menos pelo famoso nariz que cresce no boneco de madeira quando ele está mentindo e mais por tudo o que aprende ao longo das situações nas quais se envolve, com interlocutores dos mais diversos. Pinóquio poderia tranquilamente ser um personagem freudiano, por exemplo, tamanha a riqueza de suas experiências e descobertas.
Para quem não se lembra, tudo começa quando um pedaço de madeira falante aparece misteriosamente na oficina de mestre Cereja que, assustado, presenteia o amigo Gepeto com a tal “madeira viva”. Gepeto imediatamente planeja criar uma marionete espetacular, mas seus planos vão por água abaixo porque o boneco tem vida própria e nenhuma disposição para seguir as orientações de seu criador. Tão logo nasce, Pinóquio já começa a aprontar poucas e boas. E seu nariz começa a crescer até se tornar um “narigão interminável” quando se envolve em mentiras. Na medida em que vai descobrindo o mundo, Pinóquio se mete em várias confusões. Vende a cartilha que ganhou de Gepeto, escapa de ir à escola e vai parar no Grande Teatro de Marionetes. Ele se defronta com as artimanhas da Raposa e do Gato, que o levam para o Campo dos Milagres e tentam enforcá-lo. Do seu lado estão o conselheiro Grilo-Falante e a Fada de cabelos azuis, que aparece para salvá-lo da armadilha do País dos Brinquedos, onde os meninos se transformam em burros. Na trajetória de transformação de boneco a menino, Pinóquio sofre bastante até descobrir a solidão da condição humana. É uma estória linda e divertida que tem a ver com a própria descoberta da vida.