Novíssimas ou nem tanto, obras que confirmam a política como tema sob medida para ótimos livros
*Matéria publicada na revista Vila Cultural edição 190 (Fevereiro/2020)
Um gênio muito estável – A ameaça de Donald Trump à democracia
Da Companhia das Letras pelo selo Objetiva, o livro dos jornalistas Philip Rucker e Carol Leonnig se constrói a partir da experiência de ambos em três anos de reportagens aprofundadas sobre as formas como Donald Trump molda o papel de presidente à sua própria imagem, desestruturando antigas alianças com países amigos e levando as instituições norte-americanas ao limite. O mais instigante é que, como mostram os autores, existe, no aparente caos, um padrão, uma forma de agir que dá sentido aos desastres diários provocados por Trump.
Tormenta – O governo Bolsonaro: crises, intrigas e segredos
Lançado em janeiro, o livro da jornalista Thaís Oyama para a Companhia das Letras chegou causando interesse instantâneo. Em 272 páginas, ela revela como opera, no primeiro ano de um mandato polêmico, o governo do 38º presidente da República, as forças que se digladiam no Palácio do Planalto e de que forma as crenças e os temores – reais ou imaginários – de Bolsonaro e de seus filhos influenciam os rumos do Brasil. Tudo com riqueza de detalhes sobre a crise interna do mandato, revelando segredos dos generais que o cercam no Palácio, as intrigas que corroem o primeiro escalão do poder e bastidores que não chegam aos jornais.
Sobre o autoritarismo brasileiro
Desde o lançamento, em abril do ano passado, o livro da escritora, pesquisadora e historiadora Lilia Moritz Schwarcz para a Companhia das Letras mantém seu fôlego com uma reflexão superpertinente para o atual momento do Brasil. Com muitos dados estatísticos, o livro examina o que Lilia identifica como as raízes – bastante antigas e arraigadas – do autoritarismo brasileiro, ainda que frequentemente mascaradas, já que, como ela argumenta, os brasileiros gostam de se crer diversos do que são. “Tolerantes, abertos, pacíficos e acolhedores são alguns dos adjetivos que habitam frequentemente a mitologia nacional”. Só que não. Na vida real, conforme ela demonstra, não é bem assim.
Como as democracias morrem
De Steven Levistsky e Daniel Ziblatt para a Zahar, o livro lançado por aqui em 2018 segue superando fronteiras, em vários idiomas, com a reflexão sobre o atual panorama geopolítico mundial. Trata-se de uma análise intensa, que às vezes assusta. Ao discutir como a eleição de Donald Trump se tornou possível nos Estados Unidos, os dois comparam o caso americano com exemplos históricos de rompimento da democracia nos últimos cem anos: da ascensão de Hitler e Mussolini nos anos 1930 à atual onda populista de extrema-direita na Europa, passando pelas ditaduras militares da América Latina dos anos 1970. E alertam que enfraquecimento lento e constante de instituições críticas como o judiciário e a imprensa e a erosão gradual de normas políticas de longa data são indícios perigosos neste momento.
Why not
Da jornalista Raquel Landim para o catálogo da Intrínseca, o livro conta a história (inacreditável) da JBS, que, pelas mãos dos irmãos Wesley e Joesley Batista saiu da condição de pequena empresa familiar para transformar-se em gigante mundial. No ritmo de um thriller político e empresarial, após dois anos de apuração e mais de uma centena de entrevistas, a jornalista investiga um dos maiores esquemas de corrupção já descobertos em uma empresa privada brasileira e dá detalhes que fazem o leitor, às vezes perplexo, se sentir um observador invisível no submundo do poder e da ganância.
Legado para a juventude brasileira
Da Record, o livro do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em parceria com a educadora Daniela de Rogatis tem o propósito, como ele disse, de consolidar a experiência de anos de conversas permanentes com grupos de jovens, os prováveis líderes do amanhã, acerca do que é possível fazer para que a estabilidade do Brasil se torne princípio inegociável. Nas reflexões, FHC assume a persona do intelectual experiente ao dialogar com uma juventude que se sente engessada ante o colapso do sistema político e que, inclusive por isso, procura os meios de participar da vida pública nacional.
Nada menos que tudo
Para a Planeta, o livro do ex-procurador-geral Rodrigo Janot segue dando o que falar. Em especial pelas revelações sobre grandes nomes da política brasileira, como os ex-presidentes Lula, Dilma Roussef, Michel Temer e José Sarney, e políticos como Aécio Neves, Eduardo Cunha, José Serra, Fernando Collor, José Genoíno e Renan Calheiros, entre outros. Aposentado e sem pretensões políticas, Janot repassa os bastidores, as intimidações e as pressões que diz ter sofrido continuamente, além de recordar diálogos e situações improváveis, para dizer o mínimo. Nas entrelinhas do polêmico livro, há possíveis explicações para a escalada do movimento que levou Jair Bolsonaro à Presidência da República.
A elite do atraso
No título da Sextante, o sociólogo Jessé Souza apresenta uma nova visão sobre as causas da desigualdade que marca o Brasil e reescreve, com fluência e ironia, a história da sociedade brasileira. Mas não, como ele argumenta, a do patrimonialismo, suposta herança de corrupção trazida pelos portugueses na tese utilizada tanto à esquerda quanto à direita para explicar o Brasil. Muito menos a do brasileiro cordial, ambíguo e sentimental. Na essência da interpretação de Jessé não está a corrupção política. Para ele, a questão a partir da qual se deve explicar a história passada e atual do Brasil – e de suas classes, portanto – não é outra senão a escravidão.
Por que lutamos? Um livro sobre amor e liberdade
Feito para a Planeta, o livro de Manuela D’Ávila, que foi candidata à vice-presidência do País nas eleições de 2018, é “sobre feminismo através do olhar amoroso, da acolhida generosa, do entendimento de que este é um assunto de todas, todos, todxs nós”, conforme argumenta, no texto de apresentação, a atriz e escritora Maria Ribeiro. Inclusive pela atuação política de Manuela, que se manifesta e se posiciona regularmente e publicamente sobre o dia a dia político brasileiro, é uma leitura que esclarece sobre a atuação das mulheres em uma história e um ambiente notadamente machistas – e cheio de obstáculos, portanto.
O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota
Da Record, o livro junta 193 artigos e ensaios de Olavo de Carvalho organizados por Felipe Moura Brasil. Os textos assinados pelo controverso escritor foram publicados em diversos veículos da imprensa brasileira entre 1997 e 2013 e trazem reflexões sobre questões do dia a dia, análise e comentários sobre notícias e o que, na percepção dele, se passa na cabeça do brasileiro. Do regime militar ao petismo, do governo de George W. Bush ao de Barack Obama, entre outras pautas, Olavo escreve do mesmo jeito que pensa e fala, ou seja, sem muitos filtros e sempre disponível para polemizar.