O Brasil se despede de Dona Ivone Lara, que venceu preconceitos e se transformou na “primeira-dama” do samba
Ilustração Jonas Ribeiro Alves
O Brasil ficou menos musical e poético no mês passado com a morte de Dona Ivone Lara (1922-2018), a cantora e compositora merecidamente referenciada como a “grande dama do samba”. Ela tinha completado 96 anos no dia 13 de abril, quando foi internada, no Rio de Janeiro, e morreu na segunda, dia 16, por causa de uma insuficiência respiratória.
O tamanho da saudade que deixa no meio musical só deve ser superado pela grandiosidade da obra e da presença cativante de uma mulher que, pela música, se empoderou artisticamente e manteve, sem alardes, a discrição como um valor para sua
vida pessoal.
“Me sinto feliz da vida quando a inspiração chega. Vem a melodia e começo a cantarolar. Quando ela vem, ela fica, não esqueço de jeito nenhum”, dizia a artista. Dona Ivone nasceu em uma família de amantes da música popular e superou muitos preconceitos por ser mulher e sambista. Seu maior sucesso é canção Sonho meu, que se transformou em um clássico da MPB desde que foi gravada pelas cantoras Maria Bethânia e Gal Costa.
Carioca de Botafogo, formada em Enfermagem e Serviço Social, Dona Ivone trabalhou na área de saúde até se aposentar, no final dos anos de 1970. Sua trajetória está registrada na excelente biografia Dona Ivone Lara – A primeira-dama do samba (Sonora), de Lucas Nobile, que integra o projeto Sambabook.
Nobile faz entender como Dona Ivone foi pioneira ao quebrar barreiras em um ambiente dominado por homens, sendo a primeira autora de um samba de uma agremiação da elite do Carnaval e a primeira figura feminina da ala de compositores de uma
escola de samba.
Compositora desde os 12 anos e colecionadora de parcerias com nomes como Delcio Carvalho, Jorge Aragão, Hermínio Bello de Carvalho, Nei Lopes e Caetano Veloso, é considerada uma das maiores melodistas da música brasileira e ganhou o apelido de “primeira-dama do samba” por compor, cantar com aberturas de vozes e improvisos, tocar um instrumento, além de assinar o próprio figurino.