Agora em domínio público, a obra do criador do Sítio do Picapau Amarelo movimenta o mercado editorial
*Matéria publicada na revista Vila Cultural 178 (fevereiro/2019).
O ano de 2019 começou com uma excelente notícia para novas gerações de leitores. A obra de Monteiro Lobato entrou em domínio público no dia primeiro de janeiro e, a exemplo do que acontece com outros autores, no Brasil e no mundo, isso significa que agora, sem os custos dos direitos autorais, o mercado editorial vai promover a “redescoberta-renascimento” de Lobato. Na prática, a visibilidade e a evidência fortalecem a memória e o acervo de um autor genial, o precursor e o nome mais importante da literatura infantojuvenil brasileira.
Os lançamentos já começaram e estimulam ao mesmo tempo a inventividade, a agilidade e a competitividade mais saudável das editoras para ganhar a atenção do público. Em meados de fevereiro, por exemplo, a Companhia das Letrinhas disponibiliza sua versão para Reinações de Narizinho, uma edição de luxo que integra a coleção organizada por Marisa Lajolo, especialista na obra de Lobato. Com mais de 200 páginas, o livro traz lindas ilustrações de Lole, pseudônimo da ilustradora Alessandra Lemos, que revisita, com sua narrativa visual, o mundo criado pelo escritor.
Reinações de Narizinho é o primeiro de uma série de livros que abriria as porteiras do Sítio do Picapau Amarelo para os pequenos leitores do Brasil. Com seu universo único e encantador, as aventuras de Narizinho, Pedrinho, Emília e tantos outros personagens acontecem nos arredores do Sítio e no Reino das Águas Claras, e consagraram Monteiro Lobato.
Na introdução do Reinações da Companhia das Letrinhas, a professora de literatura brasileira e teoria literária Cilza Bignotto escreve que diversas passagens da obra de Lobato “nos lembram o quanto o Brasil mudou; o quanto nós, leitores, somos diferentes dos leitores do passado; o quanto modificamos, com nossas leituras, as cenas que lemos”. Dirigindo-se aos pequenos leitores, Cilza explica o seguinte: “Você vai se deparar com vários comportamentos hoje tidos como inadequados, mas vistos com naturalidade num tempo em que crianças viajavam sozinhas e brincavam com canivetes. Conhecer práticas antigas e pensar sobre elas, comparando-as com as atuais, será uma das grandes experiências em companhia das personagens do Sítio. Significará também prestar atenção no que mudou, e no que persiste, ainda nos dias de hoje, no país em que vivemos”.
As reedições e a “volta” de Monteiro Lobato, é bom lembrar, vêm todas com o cuidado de contextualizar afirmações e caracterizações que identificam traços racistas em sua obra. “Todos sabemos do magnífico e grandioso escritor que foi Monteiro Lobato, mas sabemos também da polêmica sobre o caráter preconceituoso e racista contra negros, estampado em muitas de suas obras e demais escritos.(…) Pessoalmente, concordo com as críticas de que exista preconceito e discordo que a criação literária seja soberana, ainda que agrida e vilipendie a dignidade humana, principalmente, na obras infantis. O intrigante e curioso, todavia, é que, mesmo imerso e tomado por essas crenças, ele retratou e deu voz e protagonismo a personagens negros, fato difícil de se encontrar em tantos outros livros de escritores brasileiros”, escreve o sociólogo e o reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares José Vicente, na orelha de Narizinho Arrebitado (Girassol), que traz a assinatura de Mauricio de Sousa (leia entrevista com o escritor aqui), o genial criador da Turma da Mônica, ao lado de Monteiro Lobato.
No livro, Magali surge como Narizinho, Mônica é a Emilia, Cebolinha é apresentado na pele de Pedrinho e toda a magia do universo de Lobato se mantém na adaptação que vem com a assinatura da professora Regina Zilberman, autora, entre outros, de Como e por que ler a literatura infantil brasileira (2014) e Literatura infantil brasileira – Uma nova/outra história (2017). “Lidar com as figuras imaginadas por Monteiro Lobato, oriundas do fundacional Reinações de Narizinho, pensando agora no leitor criança, foi uma experiência totalmente nova. E extremamente gratificante, porque, ainda que tenha nascido há muitas décadas, Narizinho Arrebitado permanece uma narrativa ágil, moderna, engraçada e provocante”, escreve Regina na apresentação do livro.
Os livros já confirmados da obra de Monteiro Lobato
Monteiro Lobato (1882-1948) nasceu em Taubaté, no interior do estado, e estudou Direito em São Paulo. Ele cresceu na fazenda Buquira, onde “descobriu” a imensa biblioteca que pertencia ao seu avô. Leu tudo que havia para crianças e começou a escrever pequenos contos. Sua grande estreia como escritor se deu em 1918, com o lançamento do livro de contos Urupês. Ao longo de toda sua vida, Monteiro Lobato escreveu e trabalhou com os mais diversos gêneros literários, mas foi na literatura infantil, com os livros do Sítio do Picapau Amarelo, que ele conquistou leitores por
todo o Brasil.
“Com espírito inovador, em uma época em que os livros brasileiros eram editados na Europa, Monteiro Lobato tornou-se editor passando a imprimir e publicar livros também no Brasil, revolucionando assim a indústria editorial nacional”, lembra o texto biográfico que está no título recém-lançado pela editora Girassol.
O que vem por aí
Os livros já confirmados da obra de Monteiro Lobato:
Coleção Turma do Sítio do Picapau Amarelo
Vários títulos e histórias, em lançamento da editora Ciranda Cultural
A chave do tamanho
Edições da Autêntica e do selo Biblioteca Azul/Globo Livros
O Picapau Amarelo
Edições da Autêntica e do selo Biblioteca Azul/Globo Livros
Reinações de Narizinho
Edições da Autêntica, da FTD e da Moderna, numa versão feita por Pedro Bandeira
O museu da Emília
FTD
O Saci
Companhia das Letrinhas
O Minotauro
Companhia das Letrinhas
Reinações de Monteiro
Lobato – Uma biografia
Companhia das Letrinhas, de Lilia Schwarcz e Marisa Lajolo
